VALMIR JORDÃO
Valmir Jordão é poeta, compositor e performer recifense, nascido em 1961, partícipe do Movimento dos Escritores Independentes de Pernambuco - MEI-PE na década de 80. Trabalha e divulga os seus poemas nas escolas, sindicatos, associações, praças, teatros, festivais, feiras, universidades e nas redes sociais. Participou da I Copa de Poesia Portugal ficando em segundo lugar.
Instagram: @valmir.jordao
1 - SER OU NÃO SER, HUMANO
Há violência
na apresentação do onipotente
Há violência
na prepotência do estado
Há violência
na dominação tão familiar
Há violência
na condição terceiro mundista
Há violência
nas favelas, nas fábricas, nas matas,
nos campos e cidades
Há violência
na justiça, na educação, e na economia
Há violência
nas relações e transações
Há violência
na ignorância e desinformação coletiva
Há violência nas formas de nascer-viver-matar-morrer
Há paz e sacrilégios
(somente nos cemitérios)
Tudo isso é humano
- justifica o racional
impulsos, espírito, lógica, razão
matérias de primeira,
almas de terceira
dimensão…
2 - LEGALIZEM A CANNABIS
Criminalizam a maconha, por sua origem africana e a taxam de droga.
Criminalizam os negros, por sua disposição, ginga, saúde e alegria.
E os tratam inumanamente como seres inferiores, escravos e marginais.
Criminalizam os índios, por não submeterem-se aos invasores e
são por isso, exterminados e expulsos das suas terras e os tratam
como preguiçosos, indolentes e acomodados.
Discriminam as mulheres, por suas premonições, inteligência, sensibilidade e fertilidade.
E as tratam com toda misoginia e violência diária .
Discriminam a diversidade, as minorias nas suas opções de vida, sexo, celebrações e espontaneismo.
E as tratam como aberrações da natureza.
Droga, é a intolerância que difama e mata
as pessoas que pensam dialeticamente diferente.
Droga, é o preconceito que habita nas mentes
estreitas e reacionárias.
Droga, é o consumismo que está acabando com a possibilidade
de um planeta que tenha qualidade de vida.
Droga, é o capitalismo que explora, exclui e detona
todo o resquício de humanidade entre as pessoas.
Droga, são as religiões cegas, que não enxergam
nos humanos, a transcendência divina.
Droga, são os políticos omissos, corruptos e oportunistas
que usam as pessoas como degraus para os seus
mesquinhos objetivos.
Droga, é a violência que virou cultura em nossa
sociedade repressiva, hipócrita e autodestrutiva.
Maconha é remédio, é recreio, socialização, roupa,
sapato, bolsa e condimento.
Maconha, medo, maldição
travaram as portas
da percepção...
3 - SONETO PARA ELZA
Elza Soares, suor, luta e vitória
Núbia Rainha e deusa do samba,
do Morro para o asfalto é história
Vintém, Mocidade berço de bambas.
Cara de Palhaço do planeta fome
Padre Miguel em ritmo profundo
no Sambódromo escreve o seu nome
Central Park, mulher do fim do mundo.
Amada musa dos fantásticos dribles
do serelepe anjo das pernas tortas,
fintando as inevitáveis diatribes.
O meu país é o meu lugar de fala
retumbante voz rouca que se importa,
canta as injustiças e não se cala.
4 - enes
não
nunca
negue
negão
negam
negrada
negros
navios
negreiros
novos
números
nisso
nós
naturalmente
não
negociamos
nossa
natureza
nanã
nina
nesta
necropolís
nunca
nada
nos
nota
nas
notícias
nuvens
nascem
natimortas
néscias
nuas
novidades
novas
nigérias
nagô
núbio
n'zombi
5 - poema da inquietude
habitam em mim o poeta louco,o boêmio, o amante,
o guerreiro,o hedonista,o ignoto e
o indignado cidadão,
coruja, abelha ,formiga, lobo, raposa,
a serpente e o leão,
forte, fraco, índionegrocaboclo sincero, fugaz e hesitante
impávido, aventureiro, desconfiado, pensador , crítico e leal
povoam tupis,tapuias, galegos, zulus, persas, judeus e árabes,
pueril,adolescente,adúltero,casto,nobre,
reles,urbano e árcade
anarquista, antifascista, carnavalesco- iconoclasta- atemporal
o amor, a ternura, os afetos e os carinhos ainda residem
neste coração imperfectível, impenitente e imperscrutável
onde ninfas, faunos e minotauros no mesmo labirinto trafegam
no encontro do maturus com o musteus, não e sim convivem
livres numa dialética relação, intensa, ígnea e inefável
a conjurar o impossível, para ver o que poucos conseguem enxergar…